sexta-feira, 6 de julho de 2012

Mas que puxa!

Ontem terminei de ler o primeiro volume da coleção "Peanuts Completo - Diárias e Dominicais 1950 a 1952" de Charles M. Schulz. A coleção possui 5 volumes (lançados no Brasil), os quais nos trazem as tiras feitas por Schulz desde o início da turma do Charlie Brown.



O início da turma começa com apenas 4 personagens: Charlie Brown, Patty, Shermy e Snoop. No decorrer das tiras mais personagens vão surgindo, como Violet, Schroeder, Linus e Lucy. Aos poucos a turma vai se constituindo.

Desde de pequena gostei muito da "turma do Snoopy" (engraçado como o cachorro era o maior referencial da turma, pelo mesmo pra mim!), mas lendo a história do autor, descobrimos que a tira do Charlie Brown não foi feita para as crianças! Acredito que o fato do cachorro estar sempre associado a produtos de higiene infantil, crescemos achando que a turma do Snoopy era apenas para crianças. O fato de ser um desenho também nos remete à isso, quando pensamos que isso só se destina à elas.
Porém, lendo as tiras, e com maturidade, percebemos que o humor contido nela não é realmente para estas, e sim para adultos. Isso foi uma das coisas mais batalhadas pelo desenhista: entender as tiras como um humor para adultos. Entretanto, a mídia e o comércio fizeram da turma uma maneira de ganhar dinheiro, e sabemos que os produtos infantis são bons nisso.

No final do livro temos contato com uma "micro-biografia" de Schulz, e com uma entrevista feita com ele em 1987, onde ele fala um pouco de si, das tiras, de outros desenhistas, etc. e podemos perceber o quanto a obra é um reflexo dele mesmo.
Menino sozinho, tímido, sem amigos e um sentimento de rejeição acompanham ambos. É curioso e gostoso quando você pode analisar uma obra assim. Não sou conhecedora de cartoons ou tiras, ou nada do gênero. Mas o gostoso mesmo é poder perceber a obra e seu autor. O quanto Charlie Brown e sua turma reflete aquilo que Schulz sentia desde pequeno.
Charlie Brown tem dificuldades com amigos, dificuldades em conquistar meninas, e isso também é assumido por Schulz em sua vida pessoal no final do livro. É intrigante como através da arte uma pessoa realmente pode se expressar, e fazer daquilo a sua voz.

Charles M. Schulz

Com um humor um pouco ácido, Schulz responde as perguntas e diz nunca ter imaginado que "Peanuts" faria tanto sucesso assim, embora soubesse que fazia tiras de qualidade. Penso, que um dos grandes motivos para a tira ter feito tanto sucesso é a identificação que aconteceu entre a obra e os leitores. Uma das citações de David Michaelis ao final do livro, deixa para mim muito claro esta identificação:

"Charlie Brown foi uma grande inovação no mundo dos quadrinhos: uma pessoa de verdade, com a psique e os problemas de uma pessoa de verdade. (...) Eles foram os últimos a serem criados sem televisão, como Schulz tinha sido, e liam as reflexões de Charlie Brown como grandes questões existenciais - paradoxos sobre a condição humana em forma de quadrinhos."

Um personagem que trazia problemas reais, vividos por sua pessoa real, soubesse Schulz ou não que estava fazendo isso!

Sempre gostei de desenhos (animados ou não), e acho que erra aquele que pensa que isso se destina apenas às crianças. Os desenhos são muito ricos, e sabemos que muitos deles não possuem humores para crianças.
Penso que é uma das maneiras de uma pessoa se comunicar e levar às outras seus sentimentos, suas experiências, sua crítica, etc.
É levar através do humor questões que precisam ser pensadas!
Ou também, aquilo que não conseguimos dizer, mas expressamos através do desenho!
Pensar também num cachorro que quebra todas as regras da normalidade e luta contra o Barão Vermelho, pensa e é sarcástico, para mim, é um dos bônus da arte! É como alguém que está "de fora" nos dois sentidos: vê tudo aquilo que não vemos, e pode viver fora do padrão da normalidade o qual é exigido de nós todos os dias. Sempre gostei dessas possibilidades destinadas ao Snoopy!

Sou suspeita em falar da turma do Charlie Brown, mas venho aqui fazer a indicação desta coleção! É impossível não se identificar com aquele menino que nos remete à tantas situações de nossa vida que nos colocam em questionamento, que nos deixa pra baixo ou que nos dá esperança.
Uma criança que traz coisas que vários de nós passamos na infância, e que nos faz pensar naquilo que nos transformamos hoje, pois, somos aquilo que trouxemos dela.
Vale a pena se identificar com Charlie, ou Minduim, assim prefiro, como a Patty Pimentinha o chama (acho que também rola uma identificação nisso! rs) para conhecer um pouco daquele que vos fala, o autor. É muito bom entrar em contato com toda essa sincronicidade e perceber o quanto nos representamos através de nossos atos, sejam eles quais forem. Nós, psicólogos, aprendemos que a fala "cura", mas acredito que a fala não seja apenas verbal, ela transcende o verbal. E a arte como a música, a escrita, o desenho podem ser meios totalmente efetivos de autopercepção e transformação. Além de serem belos!
E a indicação vale a pena também pela qualidade do desenho e das estórias!



Informações sobre a coleção:
Peanuts Completo
Por: Charles M. Schulz
5 volumes (lançados no Brasil): 1950 a 1952; 1953 a 1954; 1955 a 1956; 1957 a 1958 e 1959 a 1960.
Editora: L & PM

Abç... Patrícia.